Evidio Zimmer evidio@bol.com.br
Quando Jorge
me procurou ele estava bastante nervoso. Tinha acabado de perder um amigo num
acidente estúpido, como ele mesmo o definiu e precisava de ajuda.
-
Sou Norman Cole – eu disse ao me apresentar – sou detetive de casos especiais.
Talvez eu possa ajudar.
-
Espero. Assim espero – disse enquanto sentava na poltrona que eu havia lhe
indicado.
-
Quer tomar alguma coisa?
-
O senhor tem whisky?
-
Sou de origem inglesa – respondi – adoramos essa bebida – e imediatamente fui
preparar duas doses para nós.
Ele
pegou o copo e logo sorveu um gole.
-
Se quiser começar estou pronto – falei tomei de tomar também um gole da minha
bebida. Ele se ajeitou na poltrona e começou seu relato.
-
Acho que posso ser franco. O senhor deve estar acostumado a ouvir histórias
esquisitas.
-
Exatamente – confirmei – na minha profissão já ouvi de tudo. Não creio que o
senhor consiga me surpreender.
Isso
não era de todo verdade, mas falei para deixar meu cliente mais a vontade.
-
Está bem – disse confiante – um dos meus grandes amigos foi atropelado por um
carro em alta velocidade. O motorista disse que ele estava parado no meio da
rua examinando o chão. Procuramos por provas e encontramos uma câmera que
gravou toda a sena, dando razão ao atropelador.
-
O senhor tem as imagens?
-
Tenho.
Ele
retirou um tablet de uma pasta que trazia com ele e me mostrou as imagens.
-
Observe que a câmera mostra inúmeras pessoas passando na calçada, quando o meu
amigo chega e fica perplexo.
Observei
as imagens e vi que ele tinha razão. As pessoas passavam e iam embora sem se
impressionarem. Quando Carlos, o amigo do meu cliente chega ele fica perplexo,
olha em volta, vai até o muro, olha para rua e começa a filmar com um tablet.
-
Dá a impressão de que ele viu algo que os outros não viram – falei.
-
Exatamente. Só que não é isso o que mais impressiona.
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E o que é então?
-
É o que virá em seguida.
A
câmera mostra Carlos filmando o muro, o trajeto até a pista e logo em seguida
aparece um carro em alta velocidade que atropela Carlos, jogando-o na calçada.
-
Impressionante – eu disse meio assustado com as imagens.
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Talvez o senhor não tenha percebido, mas aconteceu algo muito estranho, segundo
essas imagens.
Apertei
os lábios e me aproximei do tablet.
-
Pode ser – eu disse – sou acostumado a investigar, mas às vezes alguns detalhes
me escapam ao primeiro olhar.
-
Acho que o senhor não percebeu, mas o meu amigo filmou exatamente o trajeto que
o seu corpo fez depois de ter sido atingido pelo carro.
Eu
juro que não havia percebido isso.
-
Posso ver as imagens novamente?
Ele
ligou o vídeo novamente e aí pude ver que era verdade.
-
Caramba! – eu falei impressionado – sabe que eu não tinha percebido isso?
-
O será que ele filmou?
-
O tablet dele não mostra?
-
Na verdade o equipamento quebrou com o impacto.
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E não teve conserto?
-
Um técnico que eu procurei disse que não.
-
Eu tenho um amigo muito bom em consertos. Será que ele não conseguiria dar um
jeito?
-
Tomara – disse Jorge abrindo sua pasta e retirando de lá um tablet com a tela
quebrada. – Se o senhor quiser tentar, eu ficarei torcendo para que consiga.
Eu
peguei o tablet, lhe entreguei o meu cartão, fiquei com o número do seu
telefone, o e-mail e ele foi embora.
-
Assim que eu tiver uma resposta farei contato.
Alguns
dias se passaram até que o meu amigo me ligou dizendo que tinha conseguido
recuperar as imagens. Nem precisei ir até a casa dele. Ele me enviou o vídeo
pela internet. Depois de analisar as imagens e tirar algumas conclusões liguei
para Jorge.
-
Pode vir – eu disse – conseguimos recuperar as imagens.
Quando
ele chegou eu já o aguardava com a bebida pronta e o vídeo preparado para ser
assistido.
-
O senhor acha que encontrou a solução?
-
Creio que sim. – Fiz uma pausa, sentei, tomei um gole e continuei – ele era
espírita?
O
meu cliente ficou surpreso com a minha pergunta.
-
Sim, era. Ele dizia que falava com espíritos, parecia meio doido, mas era uma
boa pessoa – justificou.
-
Não estou aqui para julgá-lo – eu disse – estou apenas tentando entender à
situação.
-
Estou à vontade – disse o meu cliente.
-
Então vamos assistir ao vídeo que depois eu explico.
O
vídeo mostrava primeiro o próprio Carlos falando.
“Estou
diante de mais uma cena espantosa” – dizia Carlos no vídeo – “eu vejo sangue no
muro, na calçada e sinais de freada no meio da pista, mas percebo que as
pessoas passam e não se importam, como se não estivessem vendo o sangue. Vou
filmar para colher provas”.
Carlos
começa a gravar, grava o muro onde dizia haver sangue, esse que na verdade não
aparece nas imagens feitas pela própria vítima. Depois ele grava todo o trajeto
até a pista, onde segundo seu relato há sinais de freada, quando o tablet é
lançado para o alto e ao girar ainda conseguiu pegar parte da sena com Carlos
sendo arremessado para a calçada, onde morreu instantaneamente.
-
Incrível e horrível, não é mesmo? – Disso o meu cliente espantado.
-
Exatamente.
Ele
tomou mais um gole e perguntou:
-
O senhor sabe o que aconteceu?
-
Sei.
-
Então diga.
-
Segundo o que o senhor me relatou, ele era médium.
-
Pelo menos dizia ser. Também dizia que via almas que estavam no outro mundo.
-
Então segundo minhas conclusões, a sua sensibilidade conseguiu ver o seu
sangue, segundos antes mesmo de estar ali, ele já o via, mas não conseguiu
perceber que esse sangue era dele e dessa forma, tentando registrar o que os
outros não viam, caminhou para a sua própria morte.
O
meu cliente largou o copo, baixou a cabeça e pensou durante algum tempo.
-
O senhor quer dizer que ele era mesmo vidente?
-
Não.
-
Mas ele afirmou que via sangue.
-
Poderia ter sido uma alucinação e a sua imprudência o levou a morte. Já
testemunhei casos onde tudo não passava de uma alucinação. Mas esse não é o
caso. O senhor queria saber o que tinha acontecido o que o seu amigo viu, de
fato, isso não importa.
Ele
pegou o copo, tomou mais um gole e concordou.
-
É verdade. Nunca vamos saber se ele realmente era médium, se via seres que
estavam em outro mundo ou se os imaginava com tanta intensidade que até tentou
filmá-los, mas agora sei o que se passou.
O
meu cliente foi embora satisfeito e eu tive mais um caso para a minha coleção.
Afinal, sou Norman Cole, o homem que desvenda o invisível.